A Ditadura do Imediatismo

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Por Leonardo Leite

Há muito tempo aprendemos que o “segredo” de quase tudo na vida está no equilíbrio – e que a sua procura é um desafio permanente.

Aprendemos, também, que o tempo tem a sua razão de ser, e precisa ser entendido e respeitado.

Muita coisa leva mesmo um certo número de dias, meses ou anos para ser avaliada como merece.

Toda tendência (e modismo) precisa ser entendida em sua completude, para que se avalie “se faz sentido”, assim como para que se verifiquem seus “prós e contras” – até a obtenção do sonhado equilíbrio.

Muitas vezes, a conquista da consciência de que todo exagero está errado, e é perigoso, “demora um pouco”. Para alguns, bastante…

Torna-se imperativo que quem perceba e identifique caminhos equivocados esteja atento, na sociedade, nas empresas e na vida em geral, e procure “acender a luz vermelha” – para que os demais consigam enxergar o mesmo.

Via de regra, apenas os mais experientes e cautelosos conseguem perceber a necessidade, e a importância, dessa análise mais cuidadosa; antes de defender a tendência sem o devido cuidado.

Nesse cenário, é importante chamar a atenção, e solicitar os holofotes, para algo que acontece “agora”.

O mundo contemporâneo vive um perigoso culto à pressa, e à rapidez, assim como à superficialidade e a simplificação exageradas, gerando até mesmo o que já se estuda como a “ditadura do imediatismo”.

Notadamente, imaginar-se que tudo deva ser curto e rápido, desde relacionamentos e ciclos, até títulos, documentos, estudos, obras, textos e artigos, é não apenas um erro como também perigoso.

Se de um lado existem mesmo situações e exemplos em que a rapidez é fundamental, como no atendimento às emergências, do outro existe a necessidade de nos lembrarmos dos perigos da pressa.

Pensar-se apenas na rapidez das coisas, das atitudes e das condutas, e mais ainda em tentar padronizar essas questões sob o domínio da pressa é motivo de muita atenção.

O mundo corporativo cobra produção, “performance” e resultados, mas em geral é igualmente sábio ao entender que nem tudo pode ser resolvido “a toque de caixa”, sem as devidas análises de todos os pontos e aspectos envolvidos, e dos riscos.

Tempo é algo que deve ser bem empregado, não podendo ser desperdiçado, mas é preciso que esse pensamento seja bem entendido, pois atitudes e situações apressadas podem ser um péssimo exemplo do emprego do tempo.

Salvo em “situações de emergência”, como já citado, é preciso sim que busquemos o equilíbrio, que procuremos conter o imediatismo, a pressa e a ansiedade – sob pena do “remédio” ser pior do que a doença.

Precisamos ter em mente, por exemplo, a questão das narrativas, dos textos, dos documentos, dos estudos, dos artigos que tão bem conhecemos nas nossas instituições e na vida profissional. Precisamos que sejam completos, cautelosos e por vezes mais profundos e longos. Antes de tudo precisam ser adequados!

Existem situações em que os discursos e as narrativas precisam mesmo ser “cirúrgicas”, o que em muitos casos chamamos de “elevator talk”. E frequentemente precisamos de respostas e opiniões curtas e objetivas.

A questão maior está em aprender quando se trata de uma ou de outra situação.

Temos que entender que em casos de efetiva escassez de tempo precisam ser atendidos, e que nessas ocorrências devemos adaptar o que precisar ser dito ao tempo disponível. Em casos mais complexos, ou de estudos e opiniões mais robustas e maiores, o devido tempo e espaço precisa ser encontrado.

Ocorre, porém, que os mais apressados ou superficiais por vezes sucumbem à tentação da generalização perigosa, e equivocam-se ao massificar esse caminho. Como se fosse a única opção.

Reuniões, documentos e textos que de fato sejam urgentes, ou que sejam muito cirúrgicos e rápidos, podem e devem ser simples, mas apenas e tão somente nesses casos.

Escorregar na armadilha de simplificar, e apressar, demais todos os temas e as situações tende a ser terreno fértil para erros, por vezes bastante caros. Em vários casos, inclusive, sem chance de reparação.

Cabe a todos nós lutar pela detalhada e cautelosa análise de cada caso para que, com critérios inteligentes, se consiga “separar o joio do trigo” – e definir quais deles exigem a rapidez, e quais demandam maior atenção, cuidado, tempo, espaço e profundidade.

Ao longo da pandemia de 2020, por exemplo, o mundo viveu esse dilema entre a pressa e a cautela; no tocante aos possíveis medicamentos, terapias, condutas e vacinas.

De um lado a urgência se justificava, mas do outro restou evidente que era preciso (e continua sendo) profundidade de estudos, testes, pesquisas que levam (e precisam levar mesmo) algum tempo.

O mundo viu com atenção que várias das promessas de sucesso que rapidamente foram aplaudidas estavam erradas. A pressa pode cobrar um preço muito caro se levada ao extremo.

Mesmo em documentos e textos, vemos com preocupação ímpar a ditadura do imediatismo, em grande parte perigosamente ditada pelo mundo digital, que tende a simplificar tudo e massificar tudo – onde “dá e onde não dá”.

Temas e assuntos mais simples logicamente podem ser abordados rapidamente, mas outros são justificadamente mais complexos e precisam (precisam!) de mais espaço (de tempo e de papel – ou de tela).

Apressadamente, muitos comentaram, por exemplo, como seria o “novo normal”, após poucos meses da experiência de “quarentena”, sem tomar ao menos o cuidado de deixar a situação toda amadurecer, após o pico da crise, para que fosse avaliada com mais responsabilidade.

Por vezes alguns imaginam, inclusive, que há algum cabimento em se tentar ditar normas e regras para a quantidade de linhas, palavras, toques, caracteres e frases para documentos, pareceres, relatórios, textos, obras e artigos, sem o cuidado de ao menos encontrar exceções e avaliar a adequação caso a caso.

Alguns chegam até mesmo a estabelecer regras sobre o “tamanho” do título, esquecendo-se de que títulos bem escolhidos precisam dialogar com a obra – e a integram.

Precisamos todos resgatar o equilíbrio e o bom senso, no sentido de se evitar sim os exageros, mas dos dois lados, tanto do que não precisa ser muito longo quanto do que não pode e não deve ser curto ou raso demais.

Combatamos essa perigosa tendência, e resistamos a mais esse modismo do imediatismo (por vezes influenciado pelo que “Bauman” já nos alertava sobre as relações líquidas e fluidas demais).

A ditadura do imediatismo que vivemos é perigosa sim, e errada.

Lutemos para que as análises de profundidade, de enfoque, de porte e até de tamanho de reuniões e de documentos sejam adequadas – e jamais apressadas ou padronizadas, e massificadas demais.   Procuremos, sempre, o equilíbrio.

Biografia do Autor

LGPD Leo Leite Advocacia

Leonardo Barém Leite é advogado em São Paulo, especializado em negócios e em advocacia corporativa, sócio sênior da área empresarial de Almeida Advogados, com foco em contratos e projetos, societário, governança corporativa, “Compliance”, fusões e aquisições (M&A), “joint ventures”, mercado de capitais, propriedade intelectual, estratégia de negócios, infraestrutura e atividades reguladas.

Formado em Direito pela Universidade de São Paulo (“São Francisco”) com especialização em direito empresarial, pós graduado em administração e em economia de empresas pela EAESP-FGV/SP, bem como em Gestão de Serviços Jurídicos pela mesma instituição. Pós-graduado em “Law & Economics” pela Escola de Direito da FGV/SP, especializado em Direito Empresarial pela Escola Paulista da Magistratura (EPM) e em Conselho de Administração pelo IBGC/SP. Mestre em “Direito Norte Americano e em Jurisprudência Comparada” pela “New York University School of Law” (NYU/EUA). É membro de diversos conselhos de instituições brasileiras e internacionais, autor de diversas obras sobre gestão jurídica estratégica e direito empresarial, professor em cursos de pós-graduação. Integra várias comissões e comitês de advocacia corporativa em São Paulo e em outros estados. É professor em cursos de especialização em Gestão Estratégica de Departamentos Jurídicos de Empresas na FIA e na FAAP, em São Paulo, e autor de livros sobre o assunto. Foi sócio do escritório Demarest e Almeida – Advogados onde atuou por mais de 20 anos, e também advogado estrangeiro no escritório Sullivan & Cromwell em NY e na Europa nos anos 1990.

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